domingo, 20 de abril de 2008

Patricia Antoniete



Não que eu te ame assim de corpo inteiro, assim até por entre os intervalos dos dedos, por debaixo da carne, impregnada e torpe, embebida e infestada como quem acha em si um fundamento outro alheio à própria composição, um esqueleto do vento que sopra do próprio hálito. Não que eu te ame, nessas coisas tolas e miúdas, ínfimas e medíocres, ordinárias e despiciendas que enchem os dias, preenchem horas, desperdiçam anos, como o modo que teus dedos mexem pontuando as tuas frases, ou como variam os intervalos dos teus piscares de olhos conforme o assunto de que tratas, conforme teu entusiasmo, conforme a intensidade da luz. Não que eu te ame, nas minimidades e pequenas tragédias, no burilar do tempo, na suspensão triste que permeia as contrariedades despercebidas, os resíduos de fracasso que se agregam à memória dos dias. Não que eu te ame, não.
(Patrícia Antoniete)

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